Postado em sexta-feira, 21 de junho de 2019

O risco de nova guerra no Golfo

O que esperar da escalada de tensões entre Estados Unidos e Irã?


 O ataque iraniano a um drone de vigilância americano foi a última rusga na escalada progressiva das tensões entre os dois países desde abril. A questão inevitável diante do noticiário dos últimos dias é: qual o risco de uma nova guerra no Oriente Médio?

A resposta passa pelo conflito latente na política externa do presidente Donald Trump. De um lado, o repúdio à teocracia dos aiatolás, ao acordo nuclear firmado com o Irã em 2015 – e a inclinação a impor o poderio americano em seus próprios termos. Do outro, a resistência a intervenções militares custosas, de desfecho imprevisível, como foram as guerras do Iraque e do Afeganistão.

Trump tem um estilo próprio de negociar, desde que surgiu como empreendedor imobiliário na cena novaiorquina nos anos 1970. Fala grosso e mostra as garras para forçar as concessões do adversário. Foi assim que o norte-coreano Kim Jong-un, antes atacado como um louco desvairado capaz de lançar uma bomba atômica sobre Washington, se tornou um parceiro na mesa de negociação.

Usa a mesma estratégia de ameaça e intimidação contra a China na guerra comercial. Diante da retaliação chinesa contra sua primeira rodada de tarifas, impôs uma nova rodada. Ainda não piscou. O objetivo: esticar a corda ao limite de arrebentar, levar os chineses a aceitar seus termos – ou então a economia (americana e global) que pague o preço da retração comercial. É a jogada conhecida em inglês como “brinksmanship”, dançar na beira do abismo.

Com o Irã, ela se repete. O adversário, porém, tem reagido de modo menos previsível do que Trump imaginava. Levou um ano depois da saída americana do acordo nuclear para que o governo iraniano ameaçasse retomar o enriquecimento de urânio em níveis proibidos (a previsão é o limite permitido seja rompido na semana que vem).

Pouco depois, começaram os ataques a petroleiros no Golfo Pérsico, a alvos no Iraque e a oleodutos controlados pela Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos – todos atribuídos ao Irã ou a rebeldes teleguiados por Teerã.

No último dia 12, quatro petroleiros foram atingidos perto do porto de Fujairah, no Golfo de Omã. No dia seguinte, dois outros, um navio japonês carregando metanol e um norueguês com nafta, se incendiaram. O governo americano apresentou imagens que diz comprovarem se tratar de ataques com minas iranianas e anunciou o envio de um contingente militar à região.

“Se o Irã quiser brigar, será o fim oficial do Irã. Nunca ameacem os Estados Unidos de novo”, tuitou Trump na quarta-feira, em seu estilo belicoso. Ontem veio à tona a derrubada do drone de observação, que o Irã afirmou ter sobrevoado seu espaço aéreo no estreito de Hormuz. Os americanos negam. “O Irã cometeu um grande erro”, voltou a ameaçar Trump no Twitter.

As provocações iranianas têm um motivo claro. As sanções impostas pelos americanos deixaram o país em frangalhos. A inflação está em 40%, o Fundo Monetário Internacional (FMI) prevê encolhimento econômico de 6% neste ano.

Apesar de ter uma economia mais diversificada que os vizinhos, o Irã depende do petróleo para sustentá-la: 40% do orçamento do governo vêm das exportações (nos vizinhos, até 90%). Depois do acordo nuclear, elas haviam se recuperado. Em abril de 2018, foram de 2,5 milhões de barris por dia. Um ano depois, caíram e 1 milhão e, em maio, as estimativas falam em menos de 500 mil.

A maior ameaça que o Irã poderia impor à economia global é fechar o estreito de Hormuz, por onde circulam 20% do petróleo consumido no planeta. Em tal situação, a guerra se tornaria inevitável. Mas ela é improvável, pois envolveria prejuízos não apenas aos americanos, mas aos países europeus e asiáticos. Em vez disso, os iranianos parecem preferir os ataques localizados a petroleiros e oleodutos de países próximos, com o objetivo de prejudicar o fornecimento de petróleo, elevar o preço e forçar os americanos a suspender as sanções.

O maiores compradores do petróleo iraniano estão na Ásia: Índia, Japão e, sobretudo, China. O desaquecimento da economia chinesa, consequência da guerra comercial, já torna inevitável a queda das exportações iranianas e interfere no preço do barril. A alta nos últimos dias se deve mais à expectativa de acordo com os chineses que às escaramuças no Golfo Pérsico.

Uma nova guerra no Golfo resultaria numa situação bem mais complicada: a disparada dos preços do petróleo num momento em que a economia americana já dá sinais de esgotamento. É tudo aquilo de que Trump não precisa num ano eleitoral.

O mais provável é que seus instintos isolacionistas prevaleçam e ele resista a entrar num novo conflito desgastante no Oriente Médio. Isso aconteceu depois da derrubada do drone, quando ele chegou a ordenar um ataque em retaliação, mas depois cancelou a própria ordem.

O complicador é a reação do Irã. Até abril, os aiatolás estavam contidos. Pressionavam europeus, russos e asiáticos a trazer os americanos de volta às negociações. Desde então, parecem ter mudado de opinião e aceitado o convite de Trump para dançar na beira do abismo.


Fonte:G1



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