Postado em domingo, 21 de setembro de 2025
às 15:03
Prefeitura impõe restrições à redução de carga horária de servidores com filhos com necessidades especiais
Governo local alega que o município possui legislação específica e, portanto, não está vinculado a decisão do STF de equiparar direito previsto ao funcionalismo federal.
Alessandro Emergente
A Prefeitura de Alfenas tem imposto algumas restrições a redução de carga horária de servidores públicos do município que possuem filhos que demandam cuidados especiais. O governo alega que há uma crescente demanda de pedidos e que busca harmonizar o direito dos servidores com a preservação de recursos públicos.
Os servidores reclamam que, desde o ano passado, a administração municipal passou a impor restrições a redução de carga horária. De acordo Guimel Lopes, servidor de carreira da Secretaria de Educação, até o início do ano passado, o governo vinha concedendo o benefício sem perda salarial, mas parou de conceder o direito.
Segundo Lopes, foi protocolado um pedido em janeiro de 2024, mas a resposta só foi dada cinco meses depois, no dia 11 de junho. E a resposta foi de conceder a redução da carga horária com redução proporcional nos vencimentos, o que – na avaliação dos servidores – não atende a uma jurisprudência do STF (Supremo Tribunal Federal).
O que diz a jurisprudência do STF
Em dezembro de 2022, a suprema corte julgou um recurso extraordinário, que teve repercussão geral reconhecida pelo plenário. Na época, foi fixada a tese de que servidores públicos estaduais e municipais têm direito a redução da carga horária, em até 50%, sem prejuízo nos vencimentos. Essa redução é regulamentada pelo regime jurídico do funcionalismo federal e foi estendida ao funcionalismo estadual e municipal fundamentada no princípio da igualdade substancial.
Porém, o setor jurídico da Prefeitura disse, em resposta encaminhada ao Alfenas Hoje por meio da assessoria de comunicação do governo, que a extensão do direito aos servidores públicos dos municípios deve ser aplicada em casos em que não há legislação específica no âmbito local.
O que diz o artigo 233 da Lei Municipal nº 2.694/1995:
Art. 233. A jornada de trabalho nas repartições municipais será fixada por decreto do Prefeito Municipal, respeitada a duração do trabalho normal não superior a oito hora diárias e a quarenta semanais e facultadas à compensação de horários e a redução da jornada.
No caso de Alfenas, a administração municipal aponta que a lei municipal (nº 2.694/1995), que definiu a estrutura administrativa municipal, já prevê sobre o tema. O artigo 233 trata da jornada de trabalho e menciona que é facultada a redução da jornada e a compensação de horário. O texto, no entanto, é genérico e não estabelece parâmetros para casos envolvendo servidores com dependentes que necessitem de cuidados especiais.
O governo está recorrendo à lei municipal, de 1995, para estabelecer desconto proporcional nos vencimentos dos servidores. “A aplicabilidade do tema não pode invadir a esfera de competência do Município para legislar em matérias locais, somente se aplica em casos em que não há lei própria regulando a matéria”, diz o governo.
Outra discordância é em relação a proporção de redução da carga horária. A jurisprudência do STF estabelece em até 50% enquanto a administração municipal fixou em 25% com ônus – ou seja, com desconto nos vencimentos. “A redução prevista no artigo 233 da Lei 2.694/95 é no montante de 25% para uma jornada de 8 horas diárias”, afirma o governo que não encaminhou à reportagem nenhum decreto sobre a regulamentação do artigo 233.
ADHs
Com essa interpretação, feita pelo governo, as auxiliares de desenvolvimento humano (ADHs) com dependentes com necessidade de cuidados especiais, que hoje cumprem uma carga horária de 6 horas/dia, passaram a não ter acesso a redução da carga horária sem o desconto. Isso porque o entendimento da administração municipal é que o parâmetro são as oito horas/dia e, no caso, das ADHs há uma carga horária específica.
As ADHs foram aprovadas, em concursos públicos realizados em 2010 e 2016, para uma jornada de sete horas diárias, mas – em 2022 – houve a redução para 6 horas por dia. A regulamentação foi feita por meio da Lei Municipal nº 5.134/2022.
Lopes disse à reportagem que, no caso das ADHs, a redução da carga horária, de 7 para 6 horas/dia, foi concedida compulsoriamente a toda categoria e não está relacionada à demanda específica de servidores que se enquadram na jurisprudência do STF, relacionada a filhos com necessidade de cuidados especiais. O servidor ainda reclama da falta de diálogo da Secretaria Municipal de Planejamento e Gestão, que não atende os questionamentos do funcionalismo.
Em tramitação
Na Câmara Municipal, o projeto de lei, que fixa um novo regimento jurídico para o funcionalismo municipal, prevê a compensação de horas para os servidores, com redução de carga horária, que tenham filhos ou cônjuges com necessidade de cuidados especiais. A proposta está no artigo nº 86 do projeto, enviado pelo governo, está em tramitação no Legislativo, e deve provocar uma ampla discussão sobre o tema.
Uma servidora com carga horária reduzida
De acordo com o governo, hoje há apenas uma servidora com redução de carga horária, com a redução proporcional de vencimentos. Anteriormente, seis servidores faziam uso do benefício. “O posicionamento da Prefeitura é de absoluto respeito pelo direito do servidor. A adoção de um posicionamento jurídico mais harmônico visa justamente proteger o erário público e o direito de quem realmente precisa da redução, evitando o abuso do direito”, argumenta o governo.