Postado em domingo, 20 de abril de 2014 às 23:54
Atualizada em segunda-feira, 21 de abril de 2014 às 22:28

Mudança na lei para nomear cargo de jornalista abre brecha para “cabide de emprego”

A proposta é o fim da exigência do diploma em Jornalismo, porém não fixa nenhuma regra objetiva.


Alessandro Emergente

Uma alteração no Plano de Cargos da Câmara Municipal abre uma brecha legal para “cabide de emprego” na assessoria de imprensa do Legislativo. A Mesa Diretora está propondo o fim da exigência do curso de graduação em Jornalismo, porém não fixa nenhuma regra objetiva para o preenchimento do cargo.

A alteração na Lei n˚ 3.864/2005, que regulamenta o Plano de Cargos da Câmara, apenas estabelece o termo “experiência em comunicação social/jornalismo”. No entanto, não fixa nenhum prazo mínimo dessa experiência e nem menciona o registro provisionado, emitido pelo Ministério do Trabalho para jornalistas não diplomados.

Nem mesmo ensino fundamental é exigido para o preenchimento do cargo, que tem um vencimento mensal atrativo: R$ 2,8 mil por mês. No ano passado, o cargo que exigia cumprimento de carga horária de 6 horas por dia passou a ser de dedicação plena (DP). Com isso, ao invés de carga horária fixa, o profissional passa a cumprir a função de acordo com a demanda do cargo.

Emendas à vista

O texto apresentado pela Mesa Diretora ainda poderá sofrer alterações por meio de emendas parlamentares, o que deve ocorrer segundo adiantou o relator da CCLJRF (Comissão de Constituição, Legislação, Justiça e Redação Final), Elder Martins (PROS). Mas essas emendas podem enfrentar a ira de alguns integrantes da Mesa Diretora. 

O 1˚ secretário da Mesa Diretora, Enéias Rezende (PRTB), o presidente Hemerson Assis (Sonzinho/PT), e o 2˚ secretário, Jairo Campos (Jairinho/PDT), são os autores do projeto que modifica a lei em vigor. Este último disse ser contrário a proposta (Foto: Alessandro Emergente) 

O projeto entrou na pauta de votação da última sessão legislativa, mas o vereador Paulo Agenor Madeira (Paulinho do Asfalto/PRTB) pediu “vista”, ou seja o adiamento da votação por mais três dias. Com isso, a proposição pode ser incluída na ordem do dia da próxima terça-feira (não será realizada na segunda como de rotina devido o feriado de 21 de abril) em 1˚ turno. 

A medida, encabeçada pelo presidente da Câmara Hemerson Lourenço de Assis (Sonzinho/PT), contraria o que tem defendido a Fenaj (Federação Nacional dos Jornalistas), órgão que representa a categoria. A Fenaj lançou um movimento pela aprovação da PEC 2006/2012 (Proposta de Emenda Constitucional), que reestabelece a exigência do diploma para a atividade jornalística (leia mais no final da reportagem).

CPI

Até na noite deste domingo, a reportagem apurou que os vereadores ainda não haviam recebido a pauta da próxima sessão legislativa, quando será lido o relatório final da CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) das licitações.  

O documento, segundo o relator Evanílson Pereira de Andrade (Ratinho/PHS), foi protocolado na última quarta-feira (16) e devido a leitura do mesmo no início da sessão, a tendência é que a presidência da Câmara evite uma pauta extensa para não extrapolar o limite de 3 horas para a realização da reunião legislativa. Com isso não está confirmado se o projeto que muda o Plano de Cargos da Câmara estará na pauta.

Acomodação de “apadrinhados”

A mudança no anexo da Lei Municipal, que normatiza o Plano de Cargos da Câmara Municipal, foi proposta no início deste mês e é uma estratégia para manter alguns funcionários nomeados sem concurso público no quadro de servidores do Legislativo.

No final do ano passado, o Ministério Público (MP) encaminhou uma recomendação à presidência da Câmara Municipal para que exonerasse parte dos comissionados devido ao excesso de nomeações, o que estaria inconstitucional, segundo a Promotoria de Justiça. 

O promotor Fernando Magalhães Cruz recomendou exonerações devido o excesso de
cargos comissionados na Câmara (Foto: Alessandro Emergente/Arquivo)

Segundo o MP, o número de comissionados (cargos de confiança) chegou a 49, mais do que o dobro do número de efetivos (concursados), que é de 19. A situação foi propiciada após a atual Legislatura aprovar uma lei ampliando o número de cargos sem concurso público, criando 19 novas funções.  


Cada vereador passou a ter direito a dois assessores parlamentares diretos e mesmo dois vereadores (Elder e Hesse Luiz Pereira/PSDB) abrindo mão da indicação dos cargos criados, a presidência preencheu as vagas.

Além da exoneração dos cargos comissionados em excesso, o promotor de Justiça Fernando Magalhães da Cruz também recomendou que fosse feita a adequação normativa no número de portarias permitidas.

O prazo inicial, estipulado pelo MP, para que a recomendação fosse atendida terminaria em fevereiro. Mas, segundo informações extraoficiais, houve um pedido de prorrogação desse prazo. Na terça-feira passada (último dia antes do recesso), a reportagem tentou contato com o promotor de Justiça na comarca de Campos Gerais, onde ele fazia atendimentos, mas não conseguiu contato.

"Saindo pela tangente"

A estratégia da presidência da Câmara para manter os “apadrinhados políticos” foi exonerar servidores lotados em cargos de natureza técnica, sem “padrinhos” políticos. Um dos alvos foi a jornalista Cláudia Cabral, graduada em jornalismo pela Unifenas (Universidade José do Rosário Velano), que ocupava a função desde a legislatura passada.

Com o cargo de assessor de imprensa vago, a Mesa Diretora decidiu mudar o “pré-requisito” para nomeação, aproveitando uma decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) que, em 2009, derrubou a exigência do diploma de curso superior para o exercício da atividade. 

Apesar da decisão em 2009, o STF exigiu diploma de bacharel em comunicação social com habilitação em Jornalismo para nomear assessor de imprensa para o próprio Supremo Tribunal Federal (Foto: Reprodução)

O projeto, que está nas mãos dos vereadores, também “flexibiliza” o pré-requisito de outras funções como o de secretário geral, que hoje precisa ser preenchido por pessoas com graduação em alguns cursos específicos como o de Direito. O texto proposto coloca qualquer curso superior como condição legal de acesso ao cargo.

Para outras duas funções, o projeto passa a exigir apenas formação no ensino fundamental como é o caso de encarregado de almoxarifado e encarregado de transporte e patrimônio público. A medida facilitaria o preenchimento dessas vagas por indicados políticos, que terão que deixar a folha de pagamentos da Câmara caso a estratégia não dê certo.

Jornalista: situação atual

Em 2009, o STF derrubou a obrigatoriedade do diploma de curso de graduação para o exercício do jornalismo. A previsão legal estava contida em um decreto-lei (972/69), editado antes da Constituição Federal (CF) de 1988 e, por isso, não foi recepcionado pela Carta Magna. 

A Fenaj, que representa a categoria no País, lançou um movimento pelo
reestabelecimento do diploma (Foto: Antônio Cruz/Agência Brasil)

O processo foi iniciado em 2001 e se arrastou no Judiciário por oito anos até uma decisão final. O Tribunal Regional Federal da 3ª Região chegou a definir pela obrigatoriedade do diploma, o que originou um recurso especial ao STF.

Ainda em 2009, a Fenaj lançou uma campanha pelo o reestabelecimento do diploma para a atividade jornalística. O senador Antônio Carlos Valadares (PSB/SE) atendeu o apelo da Fenaj e apresentou a PEC, que reestabelece a obrigatoriedade da formação superior em Jornalismo.

Em 2012, o Senado Federal aprovou em dois turnos, por 60 votos a 4, a PEC que determina a exigência do diploma para jornalista. No final do ano passado, a CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Câmara dos Deputados também aprovou a PEC 206, que aguarda a nomeação de uma comissão especial, antes de ser levada ao plenário.

A PEC modifica o artigo 220 da CF de 1988, exigindo o diploma para as funções técnicas específicas do jornalismo, o que não abrange colaboradores e articulistas por exemplo. A exigência do diploma também não atinge jornalistas provisionados, que estejam exercendo a atividade até a data da promulgação da PEC.

STF exige diploma em concurso para jornalista

Apesar do julgamento em 2009, que derrubou a obrigatoriedade do diploma, o próprio Supremo Tribunal Federal exige a formação superior em curso de Jornalismo para o cargo de assessor de imprensa do STF. Em outubro do ano passado, o Supremo lançou um edital de concurso público no qual exige o diploma de curso superior de bacharel em comunicação social com habilitação em jornalismo.

Em Tempo

Após a publicação desta reportagem, o vereador Jairo Campos (Jairinho/PDT) entrou em contato com a redação para manifestar-se contrário a medida no que se refere ao cargo de assessor de imprensa. Ele disse que errou ao assinar a proposição e que votará contra a medida. (Leia aqui a matéria)



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