Postado em 8 de setembro de 2021

Sentido da Vida - A Eudaimonia

Autor(a): Roberto Camilo Órfão Morais

 O mundo está mudando! Afirmativa obvia, o movimento é algo inerente a existência, “panta rei” (tudo flui) diriam os gregos. O que chama a atenção na contemporaneidade é a velocidade da mudança.

Para diferentes pensadores essa acelerada mudança de época tem gerado uma crise de sentido, entendida aqui como finalidade, como vida boa. Qual o sentido da vida? É uma pergunta recorrente que tem atormentado a humanidade ao longo da história, mas que se intensificou nesse início de século XXI.

Os gregos elaboraram no primeiro texto escrito da língua deles, A odisseia, de Homero, uma concepção de vida boa e que pode nos ajudar a refletir em nossa “modernidade líquida”, expressão criada por Zygmund Bauman.

A Odisseia conta a história de Ulisses, que foi obrigado sair de Ítaca, ilha que considerava ser seu lugar natural, pois ali ele amava e era amado, para lutar por dez anos na Guerra de Tróia. Depois de terminado o conflito, cheio de saudades, meteu-se em um barco em direção a Ítaca. Mas a viagem é marcada por dificuldades. Uma delas é a parada na ilha da Deusa Calipso. A ilha era paradisíaca e Calipso nome que vem do grego calyptein, que significa esconder, era a beleza personificada. Essa Deusa ficou apaixonado por Ulisses e resolveu através do hedonismo (excesso de hedonê, prazer), mantê-lo prisioneiro.

A morte do prazer segundo Platão é a sua realização, portanto apesar de toda fruição nos braços de Calipso, todo fim de tarde Ulisses chorava na praia de saudade de sua esposa Penélope, de seu filho Telêmaco e da ilha de Ítaca. Ao amanhecer retornava o hedonismo com igual desfecho ao entardecer, com saudade e lagrimas.

A Deusa Atena vendo essa angustia, pede ao poderoso Zeus, seu pai que liberte Ulisses desse cativeiro. Calipso então oferece a ele, caso ficasse na ilha, algo sonhado por toda a humanidade, a imortalidade e a juventude. Ulisses, apesar de todo entretenimento da ilha e da beleza de Calipso, recusa a oferta e escolhe retornar a Ítaca, onde se sentia em harmonia com o universo. Os gregos incorporaram no pensamento filosófico a ideia: “uma vida boa, ainda que finita, supera, uma vida eterna, fora do lugar”.

Com a recusa Ulisses aceita ser humano, se mostrando capaz de superar o medo da morte, optando por uma existência reconciliada com o mundo e com a finitude. Em Ítaca, ele passa a ocupar o que Aristóteles chama de lugar natural, vivendo sua eudaimonia, “A vida que vale por ela mesma”.

A sabedoria dos antigos gregos propõe que busquemos nossa eudaimonia, para que possamos sentir no instante, um fragmento da eternidade - o presente sempre presente.

Essa reflexão suscitada na Odisséia é pertinente em uma sociedade marcada pela tirania do prazer na expressão de Jean Claude Guillebaud, onde o que era proibido se tornou obrigatório, gerando assim angustia e cansaço. Uma reflexão recorrente em uma sociedade onde podemos estar em muitos lugares, mas não encontramos um lugar que podemos chamar de natural, de lar.


** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Alfenas Hoje

Roberto Camilo Órfão Morais
Professor
Professor de Ciências Humanas do Instituto Federal Sul de Minas - Campus Machado.



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