Postado em 25 de junho de 2020

Sobre Carga

Autor(a): Daniela Rosa

Me sentei diante da tela em branco do meu computador com uma imensa lista de coisas pra fazer. Aliás, cena comum nos últimos meses desta pandemia especialmente para quem transferiu tudo para o “online”. Há dias muito produtivos em que tudo flui, em que vejo diante dos meus olhos a lista de afazeres e as dezenas (por vezes centenas) de mensagens de WhatsApp diminuindo uma a uma. Meu coração pula de alegria nestas ocasiões, mas o fato é que elas têm sido raras nos últimos dias.

Tudo veio pra casa: eu, meu trabalho, a escola das crianças. Tudo! E quando junto na minha cabeça o que isso quer dizer, o quanto deveria estar exatamente agora dando conta desta “listinha” e o quanto tem gente demandando, me dou conta de que mais uma coisinha veio para cá: a culpa! Aliás, esta é uma coisinha que sempre morou por estas bandas, acontece que em momentos como este ela sai da casinha do fundo e vem pra sala. Senta bem no sofá com aquele olharzinho indagador que pergunta: “E aí?”. Coração dispara só de pensar no quanto de “e aí?” mentais ou reais que me chegam ultimamente.

Mas agora, com alguns destes saltando de tudo quanto é lugar me veio uma cena à mente. A da minha máquina de lavar! Sim, parece estranho, mas me lembrei de uma cena que vivi ontem aqui em casa (ah, claro. Tudo está aqui!). Um dos meninos socou na máquina um cobertor e um lençol. Tudo bem, se a máquina já não estivesse cheia com outras peças que já estavam lavando ali. Resultado? Quando começou a lavagem a máquina logo gritou. Sim, aquela barulhada danada. Assustadora! Foi menino correndo gritando de susto, cachorro ressabiado no quintal e adultos em desespero, temendo ficar sem o eletrodoméstico em plena pandemia (caramba, não faltaria mais nada).

No final a pobrezinha ficou bem, marido correu para socorrê-la, tirou a sobrecarga, ajustou o peso e os botões e ela se pôs a funcionar. Respeitando o limite e tudo correu bem. Pra alegria geral dos adultos da casa. Mas agora, eu aqui nesta situação que descrevi pra vocês no começo deste texto me lembrei dela. Ou melhor dizendo, me senti como ela! Tem uns 10 cobertores a mais aqui, mas esta que vos fala não reúne a mesma coragem de gritar “chegaaaa, está pesado!!!!” como a minha Consul velha fez ontem. Daí decidi escrever. Só de contar isso já me ajuda aliviar e olhar aqui pra minha listinha (sim, ela continua aqui) pensando em fazer o possível. Parece fácil, mas não é não. Pelo menos, não pra todo mundo.

Claro que sou muito grata por poder atravessar esta fase, tão mais difícil para tanta gente, de forma relativamente tranquila (não perco de vista os privilégios que tenho), mas é como diz a letra “cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é...” e aqui deu uma boa pesada, estou na dor. E este texto é meu grito (discreto, por que sou dessas. Embora nem devesse...sei lá!). Compartilhar já alivia. Que possamos ter escuta nos momentos difíceis.

Ah, e se você que me lê estiver aguardando uma resposta minha para uma mensagem, ou um retorno sobre algum assunto, calma. Não é pessoal, resolvi dividir a carga em várias lavagens. Logo estaremos rodopiando para centrifugar nossas pendências. Te abraço forte, ainda que distante, e te agradeço. Só estou seguindo o meu manual de instruções de uso, que eu mesma escrevi. Que tal escrever o seu?

* Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Alfenas Hoje

Daniela Rosa
Cientista Social
Socióloga, Doula, Educadora Perinatal, Facilitadora do aleitamento materno, Consultora Educacional , Coordenadora do Espaço Sankofa-Saberes Compartihados no Município de Alfenas e membro da comissão científica do SIAPARTO (Simpósio Internacional de Parto)

http://www.facebok.com/sankofasaberescompartilhados


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